terça-feira, 28 de agosto de 2012

Dr. Seuss e o ser Militante.


       O lorax, animação baseada na obra de Dr. Seuss com o mesmo título, estreou em Março deste ano nos cinemas estadosunidenses com uma boa bilheteria. Produzido pela Universal Studios em parceria com a Illumination Entertainment, o filme levou as vozes de grandes ídolos teens atuais como a cantora Taylor Swift, no papel de Audrey, e Zac Efron no papel principal, como Ted.  A película narra a história de uma cidade que há muito tempo não possuí árvores, dominada por uma empresa de ‘Ar Fresco’ que contribui para alienar a população para vender seus produtos. Até que Ted descobre que o maior desejo da menina que ele é apaixonado, Audrey, é ver uma árvore de verdade. O menino então inicia uma busca por uma muda que ele possa levar de presente para a amada, no entanto o único que pode lhe dizer sobre as árvores é um falido empresário que mora fora dos limites da cidade e é conhecido por ser misterioso e nunca mostrar seu rosto. Através desse senhor, Ted descobre a história de Lorax, criatura misteriosa que brotou da primeira árvore derrubada pelo empresário, na época ainda jovem, consumido pelo desejo de criar uma invenção de sucesso. Lorax se apresenta como aquele que fala pelas árvores e faz de tudo para protegê-las da ganância dos homens. 

            Somos então levados a um flashback pelo senhor falido, que conta-nos como saiu de sua pacata família típica do interior para, muito desacreditado pela própria, tornar-se famoso. Comovido pelo Lorax, pelo fracasso de sua invenção ‘faz tudo’ e pelos animais da floresta com quem fez amizade, o rapaz promete não cortar mais nenhuma árvore. No entanto, quando estava aponto de desistir de sua invenção ela cai nas mãos de um cidadão que vê puro brilhantismo. De repente existe uma necessidade enorme pelo ‘faz tudo’. Finalmente tomado pela ganância e incentivado pela família, o rapaz põe abaixo todas as árvores do local e termina indo a falência por conta disso. No dia em que a última árvore caí, Lorax manda os animais da floresta embora e some ele mesmo, deixando uma palavra escrita na pedra ‘Unless’ (‘a menos que’ em português). Emergidos repentinamente de um momento emocionante do flashback nos damos de cara com o velho escondido e o menino intrigado e tiramos nossas próprias e bem óbvias conclusões: A menos que alguém lute por uma mudança as coisas irão continuar do mesmo jeito. Plano detalhe no rosto do velho “E Esse alguém é você, Ted” berra ele, do alto de seu casulo.
        Esse alguém, claro, somos nós mesmos. Nós podemos fazer a diferença, é essa a moral bem transparente do filme, como todo bom fruto de Dr. Seuss.  O velho entrega a Ted a última semente e diz que ele saberá o que fazer. Mas Ted precisa ainda remar contra a maré. Os cidadãos alienados tomam o lado de O-hare, que domina a cidade com sua empresa de ar fresco. E se preparam pra linchar o pequeno, sua paixonite e sua avó, de forma a destruir a última semente. Semente esta que brota quando Ted enfrenta pela primeira vez O-Hare, ainda na sua casa, e quando a sua avó acredita nele cresce uma folhinha e quando a cidade finalmente toma seu lado brota do topo fofo avermelhado das árvores típicas de Seuss,  e então uma muda nasce.
         Muitos consideram a luta de Ted contra O-Hare e toda a moral do filme/livro como um ato contra o desmatamento e a importância da preservação ambiental. Inclusive, alguns estudiosos compararam a situação na cidade onde passa o filme com algumas cidades reais, dominadas com companhias reais. A proteção do meio ambiente, claro, é todo o panorama do filme, mas se analisarmos os pormenores das cenas e o comportamento das personagens é possível fazermos outra leitura. 
        A cidade, antes apenas uma vila, foi criada pela prosperidade da grande empresa do velho, inclusive foi planejada pelo velho. A invenção dele criou a necessidade (que tão rápido quanto chegou foi embora) pelo ‘faz tudo’ e as pessoas foram levadas a comprar algo que não fez diferença em suas vidas. Capitalismo só por capitalismo. Quando todas as árvores caíram, gerando a falência da empresa, o ar ficou irrespirável. O-hare se aproveitou da situação e fundou sua própria empresa, criando uma nova necessidade para a população em decorrência de algo que eles não precisavam em primeiro lugar. A cidade então foi erguida com um muro altíssimo de metal e várias câmeras que vigiavam a população e um formato novo de vender o mesmo ‘ar puro’ (latinha, butijão, árvores falsas, etc), com um slogan – bem conhecido pelos brasileiros, aliás – insinuando que a vida é bela na melhor cidade do mundo.  Todos estavam cegos com o que acontecia no mundo exterior, ninguém nunca saía da ‘cidade perfeita’.
         Não estamos todos nós em cidades com muros altíssimos, vigiadas por uma câmera a cada esquina, com a constante propaganda de que esta é o melhor lugar pra se viver? Não temos todos nós uma O-Hare mandando nos nossos meios de informação a nos convencer de que isso ou aquilo é o certo?
        A menos que alguém se levante e lute para mudar a cidade nunca haverá árvores e O-Hare sempre vai dominar a sociedade cega. Precisava que Ted tomasse a iniciativa e persistisse para que conseguisse plantar a semente da mudança. Por trás da superfície gozada de um pré-adolescente apaixonado por uma menina mais velha encontra-se alguém bem comum, alguém que poderia ser eu ou você (se adicionássemos uma avó com superdisposição a esportes radicais). Nós somos Ted. Nós somos o velho falido que, depois de destruir tudo, vê-se arrependido e sem nada nas mãos. Nós somos a população de OhareCity alienada achando que tudo está bem. A menos que nós mudemos algo nada nunca vai mudar. 


Assita o trailer: